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Ele é uma das lendas vivas do hip hop brasileiro. Pioneiro em quase tudo o que fez na cena da música rap nacional. Durante muitos anos, junto com seu parceiro de microfone, Thaide, DJ HUM foi referência para uma geração inteira de DJs, MCs, B-Boys, B-Girls, Graffiteiros e até mesmo para os respeitados Racionais MCs. No final dos anos 90, após o lançamento do álbum “Assim Caminha a Humanidade”, o DJ e o MC se separaram, mas DJ Hum continuou firme sua caminhada pelos ritmos da música brasileira, ampliando ainda mais o foco da sua arte.

Abaixo você confere um bate-papo firmeza com a lenda dos toca-discos brasileira, onde ele conta um pouco de sua trajetória, suas ideias sobre a cultura hip hop, música e seus projetos atuais. Boa leitura!

Bocada Forte: DJ Hum, muito tempo já passou desde que a cultura hip hop ganhou maior notoriedade no Brasil. No passado tínhamos de lidar com o preconceito extremo à música rap e até a repressão policial. Como você encara o momento atual do hip hop?

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DJ Hum, Thaide, Geléia, Marcelinho e a Backspin Crew na Estação São Bento (1987)

DJ Hum: Venho da geração dos “Bailes Blacks” festa de Preto era pra Preto e festa de Branco era pra Branco, raras exceções em que a festa tinha um publico misturado. Musicalmente falando: havia uma linha imaginaria que dividia os estilos e as classes sociais. Foi somente com a chegada da Cultura Hip Hop (através do Breakdance) que começou a miscigenação cultural e musical que conhecemos até hoje. As reuniões nas ruas eram reprimidas, mesmo que fosse pra ouvir um som, treinar ou discutir questões políticas com certeza haveria de sofrer uma conseqüência, então o nosso “templo” era o Baile! Era lá que nos divertíamos, mas também discutíamos e aprendíamos sobre a nossa historia e os problemas sociais. Afinal só havia quatro anos que estávamos começando a viver em uma “Democracia” era preciso que as classes dominantes acostumassem com a nova “Era”. Nossa missão foi desbravar esse caminho e inserir na sociedade uma nova maneira de se pensar e fazer música. Havia muito preconceito lidávamos diretamente com uma elite conservadora que ainda não aceitava a popularidade da musica negra, mas a expansão já estava sendo sendo feita, os responsáveis: Os Disc Jockeys (DJ).

Hoje essa “nova” geração tem a tecnologia a disposição com várias ferramentas de auxilio, a mensagem chega mais rápido ao publico e assim os investidores que trabalham com marketing aceitam melhor o “Rap”. Antes nossa divulgação era feito através dos discos e shows nos bailes blacks com as Equipes de Som das periferias e também através da mídia escrita, principalmente os fanzines e os jornais.

Além de toda a história e o caminho desbravado, o Hip Hop ganhou espaço porque o controle das empresas de midia e marketing estratégico estão no comando da geração que cresceu nos anos 90 ouvindo a nossa música (a maioria dos profissionais tem em média de 30 a 45 anos). Eles estão abertos a novas propostas, idéias e aceitam as diferenças culturais e sociais. Na minha época não existia isso… Tinha que se virar pra fazer tudo. Estúdio era caro, prensar disco era caro, marketing, videoclipe… E por ai vai. E muitas vezes as coisas não saiam como o planejado. Era comum desistir da carreira artística. Resumindo: A caminhada ainda é longa mas comparando… Ficou mais fácil!

Bocada Forte: De uns tempos pra cá muitas pessoas começaram a se intitular DJs por aí. Muitas são contratadas para apresentações em casas noturnas e grandes eventos. A “cultura DJ” se popularizou, mas trouxe consigo aproveitadores. Qual sua opinião a respeito?

DJHum-01DJ Hum: Natural que apareçam aproveitadores e oportunistas, mas quem é verdadeiro vai ficar. Ser DJ é uma questão de estilo de vida, pesquisa, respeito a arte de discotecar. É preciso saber sobre o novo, o atual, mas também e preciso aceitar as origens, de onde veio tudo isso. Quando era adolescente e falava que seria DJ, as pessoas se assustavam.

Fiz parte da geração pioneira, comecei a fazer os scratchs somente ouvindo os discos, não tinha aparelho de som, meus discos ficavam na casa do meu amigo Silvinho (em Ferraz de Vasconcelos). Era lá que eu treinava e foi assim que comecei a desenvolver minha primeiras técnicas de mixagem. Nos anos 80, treinei para o primeiro campeonato que participei (o DMC) com o equipamento da Equipe Kaskatas (Wagnão e Carlinhos), depois ia tocar como free lancer pra Zimbabwe (Willian e Serafin), se apresentando nas festas do interior de São Paulo. Os shows do Thaide e DJ Hum, em 1989, eu pegava os toca-discos com o Cadico (Toco, Cabral) e ainda trampava de oficce boy. Olha só como era a correria!

Hoje os novos DJs tem informação, equipamentos de ultima geração e acesso a todas as ferramentas que facilitam a técnica e desenvolvimento, mas é preciso treinar e estudar. Vai depender deles aprender sobre a história, sobre a cultura e gênero musical no qual se identificam, e é lógico: ter uma boa coleção de discos!

Bocada Forte: Quais foram suas inspirações no começo de carreira, DJ?

DJ Hum: Sou inspirado pelos DJs americanos e suas técnicas que inovaram a cena:
Cash money, Grandmaster Flash, Joe Cooley (este era foda! Executava e combinava rapidamente as manobras de stab – backscribble – chirp isto em 1988), Magic Mike, Q-Bert e DJ Jazzy Jeff.

No Brasil pela iniciativa e o início da era das mixagens: Gregão, Silvio Muller, Iray Campos, DJ Cuca e a Equipe Chic Show (era o meu programa de rádio predileto). No Hip Hop, meus amigos que desbravaram junto comigo as primeiras técnicas da arte do scratch: DJ KL Jay e DJ Ninja.

Bocada Forte: Conte para os nossos leitores sobre suas atividades atuais e os projetos para o futuro.

DJ Hum: Junto com a Luciana Suman temos o selo Humbatuque Records, divido o tempo com o programa que apresento na Rádio 105FM (Festa do DJ Hum, no ar desde 1999) Produzo músicas pra vários artistas, nos mais variados segmentos musicais. Também faço remixes para gravadoras e selos independentes, trilhas para filmes curta ou longa metragens, jingles e também sou consultor musical.

Além das apresentações e shows, faço DJHum-05workshops, oficinas e palestras sobre a cultura Hip Hop e também nos assuntos relacionados a área e gestão editorial. Me especializei no assunto pois ao longo do tempo percebi a dificuldade, a falta de informação e compreensão que a maioria dos artistas de Rap/Hip Hop tem sobre estes temas: Direitos autorais, musica e mídia digital, royalties, produção musical, composição e criação musical em parceria, inclusão e gestão de conteúdo digital, novas plataformas, e por aí vai. Geralmente estas workshpos são realizadas com apoio das Secretarias de Cultura, SESC, Ongs. Não dá pra ser feito “particular” preciso de estrutura.

O Porque disso? A galera faz muita “burrada” preferem ouvir quem esta de fora ( geralmente com um boa grana e proposta fantasiosa) do que quem esta dentro (Hip Hop) e tem experiência… Ainda tem muito egoísmo na cena do Rap… E depois não tem como rever as ações e atitudes. É sentar e chorar. Entendeu? O mais louco que percebi é que os maiores prejudicados nestes assuntos relacionadas as obras musicas, leis de incentivo e legislação sempre foram “Os artistas de Rap”.

Também montei uma Banda onde uso o toca-discos como instrumento musical, chama-se: DJ Hum e o Expresso do Groove, o CD e vinil saem em abril de 2015. É um disco que produzi e que se inspira na Cultura de Baile. Tem Rap, Soul, Samba Rock, New Bossa, Boogie, Funky Breaks, etc. Produzi e compus todas as faixas (algumas em parceiras).

Devo o sucesso da minha carreira aos grandes Bailes Blacks. Foi de lá que saí pra conquistar meu espaço, por isso sempre toco nas festas de “Nostalgia”. Faz parte da nossa cultura, da nossa batalha. Se vencemos e hoje o Rap está popular é porque lá atrás os Bailes deram a cara a tapa e foram os primeiros contratantes dos shows de Rap. Alguns artistas deveriam se lembrar disso!

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Quero contar muita coisa… E preciso registrar isso. Tenho um vasto material guardado, enfim… Enquanto a verba pública não chega, talvez faça a uma campanha tipo crowdfunding para financiar este projeto através de doações coletivas.

Considerações finais
Dedico esta matéria a todos os guerreiros que trilharam junto este caminho e que por algum motivo tiverem que fazer escolhas difíceis e mudar a caminhada. Mas quero deixar registrado que não foi em vão, fizemos um belo e bonito trabalho, demos o nosso melhor. Vocês nos ajudaram a trilhar e pavimentar esta estrada.

Obrigado a todos que fortaleceram e fizeram parte do inicio da Cultura Hip Hop no Brasil! E agradeço aos novos, que com sabedoria estão chegando junto pra dar a continuidade da autentica Cultura Hip Hop DJs!

Abraços, DJ Hum.

Publicado por Noise D

Natural de Porto Alegre/RS, Noise D é colaborador do Bocada Forte desde 2001. Designer, Editor e Social Media do BF, tem formação em Comunicação Social.

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