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“Cores e Valores”: os Racionais ficaram lacônicos
Por Felipe Schmidt

Enquanto caminhava para dominar toda a Grécia antiga, o rei Filipe II da Macedônia, irritado com a negativa de Esparta em se render, enviou uma mensagem de aviso aos rivais: – Se eu vencer esta guerra, eu vou destruir suas fazendas, massacrar seu povo e destruir a cidade.

A resposta espartana foi simples: – Se.

Milhares de anos depois, no segundo álbum do Wu-Tang Clan, Gary Grice, também conhecido como GZA ou The Genius, resumiu seu estilo: – Seja breve: metade mais curto, duplamente mais forte.

O que os espartanos e GZA têm em comum com “Cores e Valores”, o novo álbum dos Racionais? Tudo. Ambos são a favor da concisão, do resumo, de ir direto ao ponto. Se o novo disco do grupo de rap mais importante do Brasil pudesse ser resumido em uma palavra, seria uma que faz referência à Lacônia, região onde ficava Esparta: lacônico.

Foram 12 anos de espera para 35 minutos de música, rimas aparentemente desconectadas umas das outras, temas reciclados, assuntos abordados por outro ângulo… Todo o estranhamento que possa haver com “Cores e Valores”, no fim, se resume a uma mudança decisiva. Os Racionais abandonaram a pregação; agora, são mais sutis no discurso, e isso exige maior atenção do ouvinte.

Não espere linhas que chamam atenção de primeira, como em “Capítulo 4, Versículo 3” ou “Negro Drama”; bem longe está o papo intimista e positivo de “A Vida é Desafio”. Lembra da poesia misteriosa do início de “Jesus Chorou”? É por este caminho que os Racionais enveredaram.

Por isso, em vez de músicas de sete minutos, aparecem faixas com alguns segundos. Edi Rock e, especialmente, Mano Brown condensaram suas ideias. Estão mais poéticos, capazes de passar uma mensagem com alguns poucos versos. Tecnicamente, evoluíram demais: basta ver a narração cinematográfica de “A Praça” ou o malabarismo de “Quanto Vale o Show?”.

Se você persistir e prestar atenção, vai ver que os Racionais, por um lado, nem mudaram tanto. Relatos sobre crime e necessidade de dinheiro continuam ali, prontos para serem decodificados. Preconceito e condições sociais permeiam quase todas as faixas, são inerentes ao mundo descrito pelos Racionais. Mas a nostalgia reserva os melhores momentos do disco: Edi Rock recria o início de sua carreira em “O Mal e o Bem”, enquanto “Quanto Vale o Show?” é espetacular, uma prequel contando a história do jovem Pedro Paulo antes de se tornar o super-herói Mano Brown.

Ironia das ironias: enquanto o discurso foi condensado, a produção seguiu caminho inverso. As batidas secas e simples dão lugar a instrumentais eletrônicos, detalhistas, pesados. Tão diferentes das letras que as complementam perfeitamente. Vai ser estranho ouvir os Racionais nestas faixas nas primeiras audições, mas, acredite, você vai se acostumar. Até porque, como sempre acontece com o grupo, é bem provável que a estética que trouxeram desta vez influencie o rap nacional nos próximos anos. Isso se o quarteto não resolver mudar as peças do jogo de novo.

– Se.

Publicado por Portal Bocada Forte

Pioneiro no Brasil, fundado em 1999, o BF tem como foco o original hip hop brasileiro e internacional, com ênfase na cena alternativa.

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