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FIÓTI ROMPE BARREIRAS E APRESENTA AOS PAULISTANOS UM SHOW EMOCIONANTE

Por: YARA MORAIS
Fotos: ALEXANDRE BARRENHA

2O ano era 2010. Não me recordo exatamente o mês, mas, lembro-me perfeitamente do local – Tucuruvi, zona norte de São Paulo. Um sol escaldante levou a mim e a uma colega de profissão até o bairro para uma entrevista com o rapper Kamau. E foi ali que conheci Evandro Fióti. Correndo entre as estações de metrô que ligavam o Centro à zona norte, ele carregava nas costas uma mochila com os sonhos não só do irmão, Leandro (Emicida), mas de toda a família Roque de Oliveira.

Depois deste dia, comecei a prestar mais atenção naquele trabalho. Sempre via Evandro nas festas, de porta em porta, com seu moletom vermelho, fazendo um trabalho de formiguinha. Um trabalho que, um ano depois, foi nacionalmente reconhecido e que transformou o irmão em um dos artistas mais consagrados do rap nacional.

E foram exatamente os momentos descritos nessas primeiras linhas, que passaram na minha cabeça quando, no sábado, 10 de setembro de 2016, vi o trabalho, agora como cantor de MPB, de Evandro Fióti, sendo apresentado no Sesc Pompéia. O local, cheio de ‘Gente Bonita’, mostrava a diversidade no rosto de cada um que ali estava. Negros, brancos, gringos, todo o tipo de gente esperava, ansiosamente, para ver o resultado final de um trabalho regado a tanta batalha, suor e glória.

O início? Não poderia ser melhor: Dona Jacira apresentando o filho. Dona Jacira, a responsável por tudo aquilo. Dona Jacira que um dia, disse ao filho, ainda pequeno: “cuidado com as voltas que o mundo dá. Menino saiba que a alegria e a dor estão no mesmo lugar”. A matriarca dos Roque de Oliveira, a responsável por jogar na cara da sociedade que, não, não é todo negro e pobre de periferia que entra para o mundo do crime. Exemplo? Seus filhos Leandro e Evandro.

Mas, enquanto eu desenhava em minha cabeça este texto que vocês leem, em meio a aplausos, alguém gritava “Fora, Temer”, acompanhado da multidão. E Dona Jacira anunciava – Com vocês, Evandro!


6Com a mesma timidez, sinceridade e gratidão às pessoas de quando começou vendendo os CDs do irmão de porta em porta, Fióti e sua banda subiram ao palco para apresentar o show mais esperado dos últimos meses. “Gente Bonita“, a faixa que dá nome ao EP, foi a canção escolhida por abrir ao show
e, também, a responsável por emocionar a todos os presentes, inclusive esta jornalista que vos escreve. Fióti, ali, no palco, ainda era o mesmo cara que há alguns anos atrás, articulou a participação do irmão no evento “A vida é um Moinho”. Mesmo jeito, mesma simplicidade. A simplicidade que fez com que ele e o Laboratório Fantasma fossem conhecidos e respeitados pelo mundão a fora. Mas, não parou por ai. A noite foi se estendendo e, a habilidade com os instrumentos e, a voz grave de Evandro Fióti, encontrava-se com a melodia das canções, transformando-as em verdadeiras obras de arte da Música Popular Brasileira. Cada letra, me fazia querer morar dentro da canção, de tanta energia boa que transmitira.

Pausa para o momento “Fora, Temer” e Fióti mostrou que, as origens realmente estão fincadas em sua alma. Fez um discurso digno de um menino da periferia que, sabe do que está falando e, que quer o melhor ao seu povo. Cantou bravamente “Obrigado, Darcy!“, que tem a benção e a participação de Caetano Veloso, que, mortal como nós, porém gênio, também se rendeu ao trabalho de Fióti.

Foi uma apresentação emocionante. O coração de Evandro estava na ponta dos dedos que dedilhavam o violão e na voz solta no microfone. As músicas foram de autorais à homenagens, como em uma releitura de “Olha a Pipa”, de Jorge Ben Jor. Convidados abrilhantaram a noite. Rodrigo Ogi, estava ‘liso’ como sempre na rima. Drik Barbosa, brilhou. Assucena e Raquel, divaram. Coruja, abrilhantou. Banda Alana deu o tom. Matolli, complementou. E então, Emicida, ali apenas Leandro, o irmão de Fióti, mostrou porque a humildade dos filhos de Dona Jacira fez com que eles voassem tão alto.

E então, a lembrança (‘gente boa é lembrança’) desta vez, voltou ao mesmo evento da Favela do Moinho. Centro de São Paulo, a pouca distância do Sesc Pompéia. Um prédio corroído, frio, final de tarde. O menino do moletom vermelho chegando junto ao seu irmão ainda em ascensão no rap. Emicida, com a filha recém-nascida nos braços, arrebentou no microfone. Evandro, e o seu moletom vermelho, olhava de fora. Os olhos brilhavam, como se naquelas rimas estivessem a certeza de que daria tudo certo. E deu. Desta vez, foi o contrário. Os olhos do irmão famoso que brilharam. De orgulho, de agradecimento, talvez. Essa imagem deu apenas a certeza de que Dona Jacira conseguiu. Conseguiu romper barreiras e mostrar os filhos para o mundo. Coisa linda. Obrigada, Dona Jacira!

OUÇA O EP “GENTE BONITA” NA ÍNTEGRA:

Publicado por Yara Morais

Jornalista. Pós-graduada em Ciência Política. Mãe do Yohann e fruto de Cuba.

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